Banespa, o estopim
Revista da Fenae , fevereiro de 2000
Por essa, ninguém esperava. De repente, em um grande jornal paulista, em uma edição de domingo, surge um artigo arrasador contra as privatizações, o governo FHC, as elites brasileiras, a onda neoliberal. Arrasador, com afirmações tipo ser mentira "que os países ricos estejam dispostos a ver suas empresas e seus bancos serem desnacionalizados de forma vexatória (sic, sic, sic) como aconteceu com o Brasil". Nome do autor? O ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira. O homem das "reformas". O motivo para a "virada"? A privatização do Banespa. Ou melhor, as providências tomadas por Arminio Banqueiros Internacionais Fraga para facilitar a compra por bancos estrangeiros. Aí, claramente, o governo FHC cometeu um erro de cálculo. Ao longo de cinco anos, ele abusou de aberrações no processo de privatização sem provocar reações de peso na opinião pública - mesmo porque ela tem estado anestesiada pelas mentiras dos de-formadores de opinião.
Embalados pelos sucessos, FHC/Fraga/Covas/Malan e Clinton/Camadessus/ Países Ricos se esqueceram que estavam lidando, no Banespa, com um segmento mais habituado a ser cortejado, isto é, os banqueiros brasileiros, a quem, decididamente, não é agradável a idéia de grandes bancos nas mãos de concorrentes estrangeiros. Mesmo que a eclosão de Bresser Pereira tenha sido provocada pela "desnacionalização" do Banespa, e não contra sua destatização, o obus disparado pelo ex-ministro abrange todo o modelo econômico de FHC. E, certamente, como sempre acontece no jogo político, é óbvio que Bresser atuou como porta-voz de grupos que já se movimentam, nos bastidores, para exigir mudanças. Nesse quadro, é evidente que a política de privatizações de FHC está em xeque, como nunca havia acontecido nos anos recentes. O Banespa pode servir como o estopim para detonar reações que levem ao resultado de todo o processo.
Poder de fogo
Uma sucessão de incidentes já havia provocado abalos na capacidade de manipulação do governo. O empréstimo do BNDES a um grupo norte-americano para a compra de uma energética paulista ganhou manchetes - certamente, graças ao prestígio do grupo brasileiro (falsamente) perdedor. Os lucros com o crédito fiscal (redução do IR) na compra de bancos estatais, igualmente. Esses escândalos poderiam ter-se esgotado com o tempo, como sempre acontece, não fosse o acúmulo de fatos que refletem mudanças em setores que vinham apoiando incondicionalmente o governo FHC. No Congresso, houve as revelações da CPI do Narcotráfico e as conclusões, incriminadoras, da CPI dos bancos. Nas Forças Armadas, a desnacionalização da Embraer provocou uma crise inédita. Fatos como esses, somados, provocaram alterações na opinião pública, a ponto de, ainda em novembro, a base política governista, PSDB inclusive, ter começado a questionar as diretrizes das privatizações. Além de Bresser, outro aliado inesperado entrou em cena em janeiro, aumentando o desconforto do governo: as chuvas torrenciais desnudaram as deficiências na manutenção das rodovias privatizadas, no exato momento em que os pedágios sofriam novos aumentos.
É essencial que a opinião pública tome conhecimento das mazelas da privatização. Mas, sem nenhum cinismo, mudanças significativas de rumos na política econômica só surgem quando os aliados tradicionais do governo batem em retirada. Ou trocam de trincheira, como Bresser e seus representados fizeram.   - Visite www.apdobanespa.com
APdoBanespa - 15/04/2023
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