27/07/2015 - carf.com.br
Conforme já havíamos apontado na semana passada entendemos ser adequado examinar o mérito dos processos citados como suspeitos pelas autoridades responsáveis na operação zelotes para poder apontar se houve ou não prejuízo para o fisco.
Já havíamos feito um resumo do caso MMC e agora o caso Santander — ou os casos do Santander—, merecem uma pincelada.
Em dezembro de 2008, a Receita Federal do Brasil emitiu auto de infração contra o Santander Brasil no valor total de R$ 3,9 bilhões, para exigir os pagamentos de IRPJ e CSLL referentes aos anos-base de 2002 a 2004. As autoridades fiscais entenderam que o Santander Brasil não teria preenchido as condições legais para deduzir os encargos de amortização do ágio pago quando da aquisição do Banespa.
Em junho de 2010, a Receita Federal do Brasil emitiu outras autuações no montante total de R$ 1,4 bilhão, relativamente ao IRPJ e a CSLL dos anos-base 2005 a 2007, baseados nos mesmos conceitos.
Em dezembro de 2013 a RFB emitiu mais um auto de infração no valor de 300 milhões de Reais referente ao exercício de 2008.
Em 21 de outubro de 2011, o CARF julgou o primeiro processo administrativo anulando integralmente, em decisão unanime, o auto de infração. Em relação ao mérito da decisão, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) apresentou recurso para a Câmara Superior de Recursos Fiscais (instancia administrativa superior), cujo recurso ainda não foi a julgamento. No entanto, a PGFN não recorreu da decisão que cancelou a multa qualificada agravada (150%) e a exigência do ano-base 2002 (período decaído), o que reduziu os valores discutidos para R$ 1,8 bilhões.
Em 8 de outubro de 2013, o CARF julgou os processos administrativos referentes aos anos-base 2005 a 2007 e, diferentemente do que ocorreu com o primeiro caso, o CARF decidiu desfavoravelmente ao Santander Brasil em relação ao mérito, através do voto de qualidade do presidente da Turma Julgadora (três votos favoráveis e três votos desfavoráveis e desempate do Presidente da Turma julgadora, representante da Fazenda). Também nesse caso foi afastada a multa qualificada agravada, o que reduziu o valor em discussão em R$ 400 milhões. Esse processo também é objeto de discussão e será examinado pela Câmara Superior do CARF.
O último processo ainda não foi julgado.
Quer dizer, o Santander ganhou na primeira instância do CARF um processo e perdeu outro e o terceiro ainda não foi julgado.
Assim, os processos em discussão se referem a autuações recebidas pelo Santander por conta da utilização de parte do ágio gerado na compra do Banespa para amortizar valores devidos de IRPJ e CSLL.
O ágio se dá quando uma empresa adquire outra e paga um preço além do valor patrimonial da adquirida. Essa diferença entre o preço pago e o valor patrimonial, o ágio, pode ser aproveitada para dedução no pagamento de Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
A demanda envolve o benefício fiscal concedido às empresas no País nos últimos 15 anos. Em 1997, o governo editou a Lei nº 9.532 com a intenção de atrair investidores para as diversas privatizações da época. Segundo a norma o ágio é permitido conforme certos requisitos e pode ser amortizado em no mínimo cinco anos da base de cálculos dos tributos. Essa dedução só pode ser feita quando há, entre outros requisitos, a incorporação da nova empresa na compradora e quando o ágio é registrado como despesa no balanço das empresas. Foi o que aconteceu, na compra do Banespa pelo Santander.
Pela aquisição de 30% das ações do Banespa em leilão, o Santander pagou R$ 7 bilhões, mas outros 67% foram comprados em oferta pública. Como a Lei 9.532/1997, que teve o intuito de incentivar as privatizações, autorizou compradores de empresas estatais a usar valores pagos além da avaliação dos ativos para abater tributos à razão de 1/60 ao mês, o Santander usou a estratégia. A Receita Federal, no entanto, considerou o ágio superavaliado pelo banco e impôs multa de 150% dos valores não pagos.
Além disso, os auditores da Receita também afirmaram que o ágio foi pago pela Santander Hispano, coligada sediada na Espanha que comprou as ações, e não pelo banco brasileiro. Segundo os autos, o próprio Banespa incorporou sua controladora Santander Honding, que detinha as quotas de capital social referentes às ações do próprio banco. Quem compunha a holding eram os estrangeiros. E foi o Banespa quem aproveitou o ágio para abater tributos. Assim, para a fiscalização, seriam os espanhóis que deveriam ter contabilizado o ágio. Como eles não recolhem impostos no Brasil, não poderiam aproveitá-lo para abatimentos.
Assim, a Santander Holding, ainda de acordo com a Receita, foi uma empresa criada com o único propósito de internalizar o ágio pago por sociedade estrangeira. Embora não tenha usado o termo “simulação”, o fisco acusa o banco de se valer de uma “empresa veículo”.
Independentemente do resultado final que será alcançado pelas discussões no CARF o é certo é que a questão ainda está em julgamento, não sendo possível falar-se em prejuízo ao fisco.
Mas, apesar de muitos pontos merecerem destaque especialmente no caso Santander/Banespa dois questionamentos devem ser feitos: Houve pagamento ágio na aquisição? É verdade que a Santander Holding foi uma empresa criada com o único propósito de internalizar o ágio pago por sociedade estrangeira?
Esses questionamentos é que dão suporte à legalidade ou não da operação e são suficientes para entender se as autuações devem ou não ser mantidas.
Quanto ao primeiro ponto não há dúvida que houve ágio na aquisição. O próprio governo recebeu o dinheiro, quer dizer, o Santander pagou um sobrepreço que foi destinado aos cofres públicos e a avaliação foi o governo quem fez, portanto não é possível alegar que não houve pagamento de ágio no preço de aquisição.
Desse modo, o segundo questionamento tornou-se menos importante, ou seja, o ágio existiria e seria possível de aproveitamento independentemente da existência ou não da Holding que foi utilizada pelo Santander. Aliás a defesa do banco apontou que “ao criar uma subsidiária, o Santander Holding, para participar do leilão e internalizar o ágio, o grupo não teria a intenção de causar danos ao Fisco, e sim manter o sigilo da proposta que seria apresentada na concorrência”.
A própria Procuradoria da Fazenda não contesta o ágio, na época do primeiro julgamento a discussão da PFN foi quanto a forma como o Santander fez o aproveitamento do ágio e não quanto ao ágio em si, apesar de que, com o passar do tempo a argumentação tem se modificado.
O próprio acórdão do processo nº 16561.000222/2008-72 (que tem 126 páginas e discute exaustivamente o assunto, clique sobre o número processo e leia) apontou que “as premissas básicas para amortização de ágio, com fulcro nos art. 7º., inciso III, e 8º. da Lei 9.532 de 1997, são: i) o efetivo pagamento do custo total de aquisição, inclusive o ágio; ii) a realização das operações originais entre partes não ligadas; iii) seja demonstrada a lisura na avaliação da empresa adquirida, bem como a expectativa de rentabilidade futura.”.
Isso não torna inadequado o exame de muitas das autuações nas quais aparentemente não houve ágio na aquisição de participações societárias, mas com relação ao caso em exame, trás à tona a legalidade da operação.
A preocupação hoje das inúmeras empresas autuadas em decorrência de aproveitamento de ágio — cerca de 80 grandes contribuintes e muitos outros pequenos — é a instabilidade jurídica que foi criada por essas autuações, afinal, foi o governo que deu esse incentivo para as empresas e é o governo que está tirando.
Por outro lado, ou melhor, do outro lado, está o poderoso Procurador da Fazenda Paulo Riscado, ex-chefe da procuradoria da Fazenda no CARF, hoje chefe de gabinete do Ministro Levy.   - Visite www.apdobanespa.com
APdoBanespa - 31/07/2015
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