Sobre Advogados e Demônios...
Publicado por André Mansur Advogados Associados
Eu estava curtindo meu último dia de férias, no interior de Minas. Disseram-me que o Fantástico, programa da Globo, iria divulgar uma matéria “bombástica” sobre advogados. Não dei muita bola, pois a última matéria de impacto que tinha assistido no programa foi o lançamento de uma “revolucionária” pílula para emagrecimento, que “enganaria o cérebro” das pessoas, trazendo a sensação de saciedade, levando a um emagrecimento sem precedentes.
Na época, após todos aguardarmos a tão esperada reportagem, que foi alardeada durante toda a semana, ficamos sabendo que a tal pílula mágica estaria disponível no mercado dentro de 8 a 10 anos. O que na linguagem científica significam 15, 20 anos.
Ou seja, nada de usar no próximo verão! Nem nos próximos quinze verões. Exceto para os ratos, magros e malhados, que serviram de teste para as pesquisas.
Por isso, nem dei bola. Fui para uma churrascaria com meu filho, minha mulher, e uma penca de crianças. Enchi a cara de picanhas e diversos carboidratos. Afinal, em 15 anos eu me livraria deles, de acordo com a matéria da Globo, né? E ficaria belo e magro como … ratos?
No dia seguinte, iniciei minha viagem de retorno. Já em Manhuaçu, meu tio, o advogado genial que inspirou toda a família a fazer Direito, do alto de seus 90 anos de idade e mais de 65 anos de profissão, já estava indignado com a tal matéria do fantástico. Comecei a ficar curioso... Programei: assim que eu chegar em BH, será a 14a coisa que farei. Depois de lavar as mangas que eu comprei na viagem, seria a primeira.
Assim que cheguei, abri minha caixa de emails. Tinham uns cinco lá falando sobre a tal matéria. Três clientes tinham ligado para meus escritório para perguntar se tínhamos cobrado “honorários abusivos” deles. Quando viram que não, e que poderíamos cobrar ainda mais, eles rapidamente agradeceram e desligaram a ligação. Vai entender o pessoal, né?
Agora eu teria de ver a reportagem. Localizei na internet e uma frase veio IMEDIATAMENTE à minha cabeça:
“Interromperam meu AÇAÍ para isso?”
O chororó piegas, que eu tinha acabado de ver na telinha do computador, seria o motivo de tanta celeuma, tanta polêmica?
Fato é que, como advogado apaixonado, tenho de escrever algo para meus clientes e, principalmente, para os milhões de pessoas que nos lêem, semanalmente. Pois, por mais que a musiquinha de fundo da matéria não me deixe parar de rir, tenho de explicar de forma bem séria os pontos abordados.
A matéria trata, em resumo, de dois pontos distintos:
1 - Advogados que atraem clientes e ficam com os resultados das ações, embolsando suas aposentadorias e pensões;
2 – Advogados que cobram honorários “abusivos” dos clientes, da ordem de 50% dos valores.
O primeiro caso é totalmente óbvio. Ninguém, em sã consciência, vai dizer que um profissional apropriar-se dos recursos de seus clientes, é correto. Ainda mais de pessoas tão humildes. Isso, além de ser moralmente reprovável, ainda É CRIME, e devem os responsáveis serem julgados, condenados e presos, na forma mais rigorosa da lei.
Neste ponto, não vi na matéria uma prova sequer de que isso tenha acontecido. Mas, se ocorreu (e não duvido), NÃO SÃO ADVOGADOS! SÃO BANDIDOS!
A outra questão colocada na reportagem, honorários abusivos, é bastante complexa. O conceito de abusividade é bem relativo. Por isso, vou explicar para vocês como funciona o sistema de cobrança de honorários. Nós, advogados, ganhamos de 3 formas: propositura, êxito e sucumbência.
Propositura é o valor cobrado para “entrar” com a ação. Êxito é o percentual que incide sobre o valor que o cliente GANHAR, os tais X por cento. E sucumbência é um valor ou percentual que os juízes obrigam a parte que perder a pagar ao advogado da parte que ganhar. De uma forma resumida, é isso.
No caso de aposentadorias ou benefícios rurais, a maior parte dos clientes, diante de sua pobreza, não têm condições de pagar para entrar com as ações. Assim, o advogado somente irá receber SE GANHAR A AÇÃO. Se não ganhar, não haverá êxito, nem sucumbência.
Assim, um profissional, que estudou anos a fio (e estudará até o último dia de sua vida), pode trabalhar 2, 3, 5 ou até mesmo 10 anos em um processo, sem nada receber ao final. Já que somente ganhará se vencer a ação. E como a justiça muda de “opinião” o tempo todo, é comum advogados ficarem décadas trabalhando … de graça!
Eu realmente entendo que o percentual de 50 por cento é elevado. Eu nunca teria coragem de cobrar, mas entendo quem cobra. Ao contrário do primeiro caso, onde um bandido, disfarçado de advogado, pega o que não lhe pertence (caso isso se comprove), nesta situação existe um acordo entre as partes e não um crime. Se eu fosse da OAB e fosse julgar honorários de 50 por cento, eu consideraria, sim, abusivos. Mas isso é a minha opinião, e não uma lei.
Sobre a matéria, em si, considerei um lixo, do ponto de vista jornalístico. Trata-se de um piegas apelo sentimentalóide, onde se apela para o emocional das pessoas. E dá certo por conta da musiquinha triste, ao fundo, e por se tratar de gente muito pobre, muito humilde. Apesar do que, muitos ali estão longe de serem analfabetos.
O problema deste tipo de reportagem é que ela produz alguns efeitos nefastos, independentemente de seus eventuais objetivos nobres, se houver. Os efeitos da matéria da Globo podem ser piores do que o problema que ela pretende denunciar. Sem contar que fere de morte o bom jornalismo pelo erro crasso da generalização.
Ao transformar TODOS os advogados em DEMÔNIOS, sem frisar que a maioria esmagadora dos profissionais da advocacia é decente e correta, a Globo afasta o cidadão da justiça e da defesa de seus direitos. Seria essa a intenção? Rogo a Deus para que não!
Faltou muita coisa na pobre e superficial reportagem. Mas, o que de mais importante faltou, foi apontar, quem de fato é o SATANÁS da miséria do pobre homem do campo. Faltou dizer o porquê essas pessoas humildes, quase miseráveis, são obrigadas a procurar a justiça.
Faltou dizer quem obriga essas famílias a viverem no estado de carência em que vivem. QUEM NEGA seus dignos e merecidos benefícios e aposentadorias, conquistados por direito, após anos e anos de duro trabalho sobre o sol e chuva.
Faltou dizer quem os submete a toda sorte de humilhações e perícias médicas sem sentido, por todo o território nacional. Perícias que consideram aptas pessoas completamente aleijadas e incapazes.
Agora, eu pergunto: quem são os demônios? Nós, advogados, que defendemos os direitos dos que nem sabiam que os tinham OU as entidades que surrupiam tais direitos, obrigando nossos aposentados e pensionistas à uma vida de misérias?
A grande maioria das pessoas humildes nem sabe que têm direitos. É papel do advogado divulgar tais direitos ou deixar as pessoas, em sua grande maioria pobres, ver suas pensões e benefícios desaparecem, comidas pela decadência e pela prescrição?
Por formação moral e crença pessoal não temo a matéria. Mas temo seus efeitos malignos. Que as pessoas se esqueçam de que advogados, longe de serem demônios, são anjos, prepostos de Deus na Terra.
Usamos do conhecimento da lei para ajudar, não para enganar. E não o contrário, como lamentavelmente tentou demonstrar a reportagem.
Como advogo do lado certo da lei, defendo que se punam os maus profissionais, que se travestem de advogados e apropriam-se das quantias de seus clientes. Que sejam punidos da forma mais severa possível, até mesmo através da aplicação da pena de morte profissional, e a devida expulsão dos quadros da OAB.
Que, igualmente, punam-se os maus juízes, que vendem sentenças. Os maus médicos, que vendem próteses vencidas em troca de propina, ou que negligenciam a vida, em nome do dinheiro.
Que punam os maus empresários, que corrompem agentes públicos, que também devem ser punidos por se venderem.
Punam as autarquias, que deveriam pagar benefícios dignos e aposentadorias decentes, mas que surrupiam direitos dessa mesma gente humilde e desdentada que vimos na reportagem …
Mas, também, quero que se punam os péssimos jornalistas e órgãos de imprensa, que vendem sua opinião para atender a seus patrocinadores. Que tentam burlar e sabotar eleições presidenciais. Que vendem a miséria como se fosse riqueza. E, principalmente, que se punam aqueles que vendem a mentira como se fosse verdade.
Simplesmente porque mentira vende!
Muita gente que apareceu na reportagem parece louco para aparecer. E, a eles, sugiro:
“Se querem aparecer, sejam convencionais: usem uma melancia no pescoço!”
Talvez, agora, eu possa perguntar:
QUEM SÃO OS DEMÔNIOS?
Fonte: André Mansur Advogados Associados   - Visite www.apdobanespa.com
APdoBanespa - 30/01/2015
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