Banco é condenado a reintegrar funcionária com LER

SENTENÇA - Ver Notícia



Processo nº 01861200448102003

CONCLUSÃO PARA JULGAMENTO DO FEITO

Nesta data, faço os presentes autos conclusos para julgamento à MMª Juíza do Trabalho, Dra. KYONG MI LEE, conforme determinado a fl. 397

São Vicente, 19.01.2006.

Daniella Sant’Ana Lanzilotti

P/Diretora de Secretaria

VISTOS EM SENTENÇA.

DULCILENE SILVA propõe reclamação trabalhista contra BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S/A - BANESPA, alegando ter trabalhado até 20.02.2004, como escriturária-caixa; desde 1998, vem constatando sintomas de doença profissional, LER (Lesões por Esforços Repetitivos), com emissão da CAT pelo seu sindicato profissional em 10.12.2003; foi dispensada sem justa causa, quando não se encontrava mais apta, sendo titular de estabilidade legal e convencional. Pede a sua reintegração no emprego, com liminar e tutela antecipada, bem como os títulos daí decorrentes. Deu à causa o valor de R$10.800,00.

Indeferida a liminar a fl. 45.

Em defesa, o reclamado contesta o pedido de tutela antecipada, pela ausência de seus pressupostos; invoca a prescrição; nega a existência de nexo causal entre a moléstia que acomete a reclamante e o labor desenvolvido no banco. Pede a improcedência.

Documentos foram juntados.

Laudo da assistente técnica do réu às fl. 244/97.

Laudo do Sr. Perito do Juízo às fl. 299/314, com esclarecimentos às fl. 333/41 e fl. 372/6.

Ouvidas as partes, na audiência de fl. 397.

Encerrada a instrução processual.

Inconciliados.

É o relatório.

D E C I D E - S E

1. Rejeito a prescrição qüinqüenal, embora oportunamente invocada em defesa, uma vez que as verbas postuladas pela reclamante se encontram integralmente no período imprescrito (a partir de 13.10.1999), nos termos do artigo 7º, XXIX, ´a´, da Constituição Federal.

2. Pretende a autora a sua reintegração no emprego, alegando que, ao ser dispensada em 20.02.2004, já se encontrava acometida de doença profissional - LER (Lesões por Esforços Repetitivos) - não mais apta para as funções anteriormente exercidas, invocando o art. 118 da Lei 8.231/91 e a cláusula 24ª, “d”, do Acordo Coletivo de Trabalho.

O reclamado contesta, negando a existência de nexo causal, e alegando que todas as medidas possíveis para propiciar aos seus empregados condições ambientais e cuidados ergonômicos foram tomadas, além de ser ela beneficiada pelo plano de saúde CABESP e pela assistência dos médicos da empresa.

O laudo pericial de fl. 299/314 concluiu que a reclamante é portadora de patologia de caráter ocupacional, irreversível, denominada “LER - Tendinite dos flexores e extensores do punho direito”, decorrente de movimentos repetitivos com os punhos fletidos, aliados a ausência de pausas laborativas, agilidade manual ao usar máquinas mecânicas e contagem de cédulas, com sobreposição de jornada de trabalho, e movimentação repetitiva em condição antiergonômica no desempenho de suas atribuições como caixa, ou seja, concluiu pela existência de nexo causal após a vistoria in loco das condições de trabalho. Acrescentou o Sr. Perito, ainda, que houve redução da capacidade laborativa da reclamante, reunindo esta condições de exercer funções compatíveis com a sua atual situação, porém não aquelas anteriormente exercidas.

Ademais, está comprovado, ainda, que a reclamante, ainda no curso do contrato de trabalho, através de exames ultrassonográficos realizados em janeiro e novembro/2003 (fl. 17/8 e fl. 19), já portava tendinites e sinovites nos membros superiores, tendo sido solicitada a emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho - CAT, pelo Médico do Trabalho da Prefeitura Municipal de Santos, Dr. João Luiz Gonzalez Silva, por esse motivo, em 26.11.2003 (fl. 20).

O setor médico do banco, em 17.12.2003, através da Drª Ana Paula Lins de Souza, também concluiu no mesmo sentido do laudo, com a recomendação à reclamante de “evitar esforços de repetição, fazer pausas 5 minutos em cada hora de trabalho, evitar segurar peso”, opinando, ainda, que havia possibilidade de sua readaptação em atividade compatível com sua capacidade laborativa (fl. 22/3).

Em relatório médico datado do dia da dispensa, 20.02.2004, essa mesma médica, Drª Ana Paula, que assinou o relatório de fl. 22/3 para o banco, informou que a reclamante “encontra-se em tratamento desde 24.02.2003 pelos CID M75.5 + M71.9 + F60, por DORT” (diagnósticos referentes a “bursite do ombro”, “bursopatia não especificada”, “transtornos específicos da personalidade” e Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho), além de “sem condições de trabalhar no momento”, solicitando “90 dias para tratamento” (fl. 33), concedendo a licença médica por 15 dias (fl. 34).

O médico psiquiatra Sr. Miguel Ximenes de Rezende, a fl. 35, determinou o afastamento da reclamante do trabalho por 60 dias (CID F.32.2 - episódio depressivo), a partir de 23.02.2004.

Em 01.03.2004, o médico Dr. João Luiz Gonzalez Silva (o mesmo acima citado, da Secretaria Municipal de Saúde de Santos) solicitou ao INSS o auxílio-doença acidentário por 90 dias, por DORT, com CID M75.5 + M71.9 + F32.2 (fl. 36).

A partir de março/2004, a reclamante foi submetida a tratamento médico, inclusive psiquiátrico, fisioterápico, além de acupuntura (fl. 37/43), razão pela qual foi-lhe concedido o benefício do auxílio-doença a partir de 06.03.2004 (fl. 24), com prorrogações (fl. 25/7).

A documentação trazida com a defesa apenas reforça a conclusão pericial e favorece a tese da inicial. A empresa realizou exames periódicos até final de 2000 (fl. 78/89), após o que deixou de fazê-lo, sem nenhuma justificativa.

O laudo da assistente técnica do réu dá ênfase exagerada a outras patologias localizadas na autora, mencionando apenas en passant a tendinite dos flexores e extensores do punho direito. Quanto às impugnações do réu, foram técnica e adequadamente rebatidas pelo Sr. Perito, em seus esclarecimentos de fl. 333/41 e fl. 372/6, aos quais o Juízo se reporta.

É, pois, acolhido o resultado pericial, no sentido de que a reclamante é portadora de doença profissional irreversível, decorrente do labor desenvolvido no reclamado, que reduz a sua capacidade laborativa e a impede de exercer as atribuições anteriormente desempenhadas.

Olvida-se o réu que, tendo a autora trabalhado durante quase longos vinte anos para o banco, resta impossível, diante do diagnóstico pericial, afastar o nexo concausal. Eventual acometimento de transtornos mentais, como tentou ressaltar a sua assistente técnica, não desconfigura o caráter ocupacional da moléstia constatada no laudo do Sr. Perito do Juízo, por ocorrer nexo concausal, já que as condições de trabalho concorreram para esse mal.

Nesse sentido, confira-se o teor do art. 21, I, da Lei 8.213/91, que equipara ao acidente de trabalho “o acidente ligado ao trabalho que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do segurado, para redução ou perda da sua capacidade para o trabalho, ou produzido lesão que exija atenção médica para a sua recuperação”.

Vale lembrar, ainda, que o fato de a reclamante não ter sido afastada por auxílio-doença acidentário não elide a conclusão do Sr. Perito do Juízo, mesmo porque o benefício previdenciário também é passível de revisão, sendo certo que a decisão administrativa do INSS não tem o condão de vincular esta decisão judicial.

Conforme a documentação juntada com a inicial acima descrita, a dispensa indevida da reclamante impediu-a de ser encaminhada devidamente ao órgão previdenciário mediante suspensão de seu contrato de trabalho, devendo essa condição ser recuperada para os fins legais.

Restou evidenciado que, tendo a reclamante sido admitida em 16.09.1985, começou a apresentar os sintomas em final de 2003, de forma paulatina e cada vez mais intensa. Quando, enfim, necessitou afastar-se do trabalho (v. fl. 22/3 e seguintes), foi dispensada, o que leva a crer que a rescisão contratual evitou que fosse efetivamente afastada para tratamento, obstando o seu enquadramento na hipótese do art. 118 da Lei 9.213/91.

Em observância ao disposto no art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, no que se refere à aplicação da norma dirigida aos seus fins sociais, não há como interpretar o art. 118 da Lei 9.213/91 de forma estrita, no tocante à exigência de percepção de auxílio-doença acidentário, para o reconhecimento da estabilidade ali prevista, mormente se o ato do empregador prejudicou a ocorrência de tal condição, como restou claro no caso em tela.

Nesse sentido, a propalada lisura na conduta patronal, como argüido na defesa, não se verificou. Após quase vinte anos de serviços prestados ao banco, a reclamante foi descartada de seu quadro exatamente no momento em que mais necessitava de segurança e estabilidade, com sintomas de doença profissional atestada por médicos (fl. 33 e fl. 36), além de episódios depressivos.

Constatadas tais condições quando de sua dispensa, a rescisão operada em 20.02.2004 é nula de pleno direito, nos termos do art. 118 da Lei 8.213/91, além de ser obstativa, razão pela qual procede o pedido de reintegração no emprego, independentemente de trânsito em julgado, considerando-se a urgente necessidade de reabilitação para assumir o trabalho e verificação de sua situação previdenciária, bem como dos salários do período de afastamento, inclusive as vincendas, como se na ativa permanecesse.

A reintegração da empregada em nada prejudicará o réu, visto que, pelo caráter sinalagmático da relação de emprego, o banco será beneficiado pela prestação de serviços.

Não há como apreciar a causa de pedir fundada em norma coletiva, por não juntada aos autos.

Os honorários periciais, ora arbitrados em R$ 3.000,00, ficam a cargo da ré, sucumbente.

3. Devidos os honorários advocatícios em favor do sindicato-assistente, na base de 15% sobre a condenação líquida, na forma da Lei 5.584/70.

4. Quanto à atualização monetária, fica estabelecido que deverão ser aplicados os índices referentes ao mês subseqüente ao que seria da prestação de serviços, conforme a Súmula 381 do TST.

Do exposto, nos termos da fundamentação supra, julgo o pedido PROCEDENTE EM PARTE, para condenar o banco reclamado a:

I - REINTEGRAR A RECLAMANTE NO EMPREGO, INDEPENDENTEMENTE DE TRÂNSITO EM JULGADO, e

II - pagar-lhe, como se apurar em regular liquidação de sentença, a título de: a) salários e demais direitos desde o afastamento até o efetivo retorno, inclusive parcelas vincendas, como se na ativa houvesse permanecido; b) honorários advocatícios em favor do sindicato-assistente, na base de 15% sobre a condenação líquida.

Deverá o reclamado, ainda, proceder ao recolhimento do FGTS referente ao item “a” supra, sob pena de execução direta reversível à conta vinculada da autora (contrato em curso).

Juros e atualização monetária na forma da lei, devendo esta ser aplicada com os índices do mês subseqüente ao da prestação de serviços.

Honorários periciais de R$ 3.000,00, atualizáveis desta à data do efetivo pagamento, a cargo do réu.

Custas processuais pelo reclamado, calculadas sobre o valor ora arbitrado à condenação de R$ 90.000,00, no importe de R$ 1.800,00.

Autorizados os descontos previdenciários e fiscais, ambos mês a mês, sobre as verbas deferidas no dispositivo supra, mediante a comprovação dos respectivos recolhimentos, inclusive da parte que cabe ao reclamado. As verbas de natureza salarial são aquelas constantes do item “a” do dispositivo supra.

Retifique-se a denominação social do réu para BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S/A - BANESPA, conforme a documentação dos autos, em todos os registros cartorários.

Intimem-se. NADA MAIS.

São Vicente, data supra.

KYONG MI LEE





849 - 11/05/2006
Luiz Fernando

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