Santander pode vender ativos no país
Intensas negociações agitam os cinco maiores bancos privados


Converse com um alto executivo de banco e pergunte a ele sobre as possibilidades de fusões e aquisições no setor financeiro. A resposta, invariavelmente, será a de que não há mais muitas oportunidades no Brasil. A verdade é que oportunidades como as do passado, em que um banco simplesmente comprava outro, menor, ou uma financeira, pagando em dinheiro, são mesmo cada vez menores. Há poucas opções. Mas está em curso um novo modelo de consolidação do sistema bancário, muito mais complexo.

As negociações, agora, envolvem as matrizes de bancos estrangeiros e pagamentos com participações acionárias. Foi assim com o Itaú, que em maio acertou a incorporação do BankBoston no Brasil, Chile e Uruguai, em uma negociação direta com o controlador, o Bank of America Corporation (BAC). Em troca dos ativos, os americanos abocanharam uma participação acionária de 7,4% no Itaú e ganharam alguns direitos, entre eles o de indicar um conselheiro.

O desenho de operação chamou a atenção de outras instituições estrangeiras e de bancos de investimento. Altos executivos comentam que o Santander, por intermédio do banco de investimentos Goldman Sachs, apresentou uma proposta semelhante aos três maiores bancos privados - Bradesco, Itaú e Unibanco. A instituição espanhola, que em 2000 pagou o valor recorde de R$ 7 bilhões pelo Banespa, entregaria seus ativos no país em troca de uma fatia no capital do banco nacional.

Dos três bancos nacionais, o Itaú recusou o negócio por causa da recente parceria com o BAC, apurou o Valor. Procurados, Itaú e Unibanco informaram que não comentam rumores de mercado. A superintendência de relações com a imprensa do Santander no Brasil - quarto maior banco privado do país - informou que não é verdade que haja qualquer proposta desse tipo. Fonte do Valor disse que viu o documento.

O Santander, que está em dez países da América Latina, acaba de concluir a integração tecnológica dos sistemas do Santander e do Banespa, que até pouco tempo não eram compatíveis. O investimento foi de R$ 2 bilhões. Também integrou todos os bancos adquiridos (além do Banespa, Banco Geral do Comércio, Noroeste, Meridional e Bozano, Simonsen) sob um só nome, o Santander Banespa. E passou parte do pessoal da área administrativa para a operacional.

"Uma operação como essa (de negociação dos ativos no Brasil) seria surpreendente porque eles têm adotado uma postura bastante agressiva, tanto em marketing como em lançamento de produtos", afirmou um analista. Ele reconheceu, porém, que no Brasil a instituição ainda não conseguiu uma rentabilidade adequada aos seus investimentos. Outro especialista ressaltou que o Santander tem hoje uma plataforma, uma infra-estrutura, muito maior do que o número de clientes. "É o que chamamos de capacidade ociosa, na indústria", explicou.

Uma questão difícil para o banco, nos próximos meses, será a retenção dos funcionários públicos do Estado de São Paulo, que representam 13% da carteira de 6,7 milhões de correntistas do banco. A partir de 1º de janeiro, o pagamento desse pessoal, antes feito pelo Santander, passará à Nossa Caixa, controlada pelo governo paulista.

No exterior, o Santander costuma apresentar sua diversidade geográfica como um ponto positivo. Mas, depois da moratória argentina e da crise brasileira em 2002, a instituição tem se esforçado em mostrar que está menos dependente da América Latina. A região tem sido vista com reservas por analistas, uma percepção que se agravou com os governos de Hugo Chávez, na Venezuela, e Evo Morales, na Bolívia. Em 2004, o banco espanhol adquiriu o inglês Abbey National, por US$ 16,1 bilhões, e vem destacando nos relatórios seu crescimento na Europa.

"Uma operação como a do Itaú com o BankBoston não significa que o BAC considera o Brasil menos importante em sua estratégia. Mostra apenas que, em vez de competir com o banco local, é melhor juntar-se a ele e colher os frutos dessa associação", explicou um banqueiro de investimentos. Ele ressaltou, ainda, que apesar da forte valorização das ações dos bancos brasileiros nos últimos anos, há um potencial de ganho com uma eventual elevação do Brasil ao status de "investment grade" (classificação para bom investimento).

Apenas como exercício e desconsiderando a previsível resistência do BBVA, já parceiro do Bradesco, a associação com o Santander levaria o banco brasileiro a primeiro lugar no ranking por ativos, com R$ 323 bilhões, com base em dados da Austin Asis. O Unibanco dobraria de tamanho e ficaria perto do segundo, o Itaú.

Desde que o negócio entre o Itaú e o BankBoston foi fechado, há uma agitação entre os cinco maiores bancos privados do país. Nas últimas semanas, segundo o Valor apurou, executivos do Bradesco acompanharam com atenção os rumores sobre uma possível aquisição, no exterior, do ABN Amro pelo Bank of America. O temor era de que os americanos poderiam usar o Banco Real (hoje controlado pelo ABN) para ampliar sua participação no Itaú. Um negócio como esse levaria o banco dos Setubal e Vilela à liderança no ranking das instituições financeiras, com R$ 291 bilhões em ativos (em junho, o Bradesco tinha R$ 232,9 bilhões).

Os rumores sobre o Bank of America e o ABN tomaram conta não apenas do mercado brasileiro, como também do europeu. Mas há dificuldades que tornam remota a concretização do negócio. A primeira delas é de que, nos Estados Unidos, a legislação prevê que um banco americano pode ter no máximo de 10% do total de depósitos bancários no país. O BAC já atingiu o teto e o ABN é hoje um dos maiores bancos estrangeiros nos EUA. Além disso, uma operação dessa passaria, no Brasil, pelo crivo do CADE, com grandes riscos.

Fonte: Valor Online


936 - 20/10/2006
João Bosco

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