TERMO DE AUDIÊNCIA
No dia 17 de maio de 2006, às 18h54min, na sala de audiências da 1ª
Vara do Trabalho de Florianópolis, sob a presidência do Dr. José
Ernesto Manzi, MM. Juiz Titular, foram, por sua ordem, apregoadas as
partes (CLT, art. 815), a saber: NATANAEL THOMASELLI, reclamante e
BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S.A. - BANESPA, reclamado. Ausentes as
partes. A seguir foi publicada a seguinte
SENTENÇA
I RELATÓRIO
NATANAEL THOMASELLI, qualificado na inicial, propôs reclamatória
trabalhista em face de BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO S.A. - BANESPA,
pugnando, após exposição de fatos e fundamentos jurídicos, os
pedidos que arrola às fls. 12-3 dos autos. Atribuiu à causa o valor
de R$ 17.000,00.
Notificada (CLT, art. 841), compareceu o réu em audiência. Proposta
a conciliação (CLT, art. 846), a tentativa restou inexitosa. O réu
ofereceu defesa (CLT, art. 847), sob a forma escrita, onde pugnou
pela a suspensão da ação e pelo reconhecimento de que o autor litiga
de má-fé; argüiu ainda as preliminares de litispendência,
ilegitimidade ativa e passiva ad causam, e impossibilidade jurídica
do pedido. Como prejudicial de mérito argüiu a prescrição e, no
mérito, requereu a improcedência dos pedidos.
O autor manifestou-se às fls. 144-49.
As partes juntaram documentos. Não havendo mais provas, encerrou-se
a instrução, com razões finais remissivas. Renovada a proposta de
conciliação (CLT, art. 850), restou ela inexitosa.
É o relatório. Decide-se.
II FUNDAMENTAÇÃO
QUESTÕES PROCESSUAIS
a) Prioridade de tramitação: o autor nasceu em 05-01-1949 (fl. 16),
possuindo na presente data 57 anos, não fazendo jus, portanto, à
tramitação prioritária prevista no art. 71 da Lei nº 10.741-03
(Estatuto do Idoso). Vale ressaltar, de outro norte, que a
celeridade é princípio especialmente resguardado no processo do
trabalho. Indefiro.
b) Segredo de Justiça: o autor não justificou a razão de seu
requerimento para que o processo tramitasse em segredo de justiça.
Ademais, não se visualiza nos autos qualquer das hipóteses dos arts.
93, IX, da CF/88, e arts. 155 do CPC. Ressalte-se que o direito à
informação e à publicidade dos atos processuais são direitos
fundamentais do cidadão (art. 5º, LX, da CF/88). Indefiro.
c) Suspensão do Processo: deixo para apreciar o pedido de suspensão
do processo juntamente com a preliminar de mérito de litispendência,
por demandar a análise de idêntica fundamentação.
PRELIMINARES DE MÉRITO
a) litispendência: argúi o réu a preliminar de litispendência (CPC,
art. 300, V), argumentando que a AFABESP - Associação dos
Funcionários Aposentados do Banco do Estado de São Paulo ajuizou
diversas ações ainda em curso, compreendendo objetos idênticos e/ou
prejudiciais aos da presente demanda.
Conforme prevê o art. 301, § 3º do CPC, "há litispendência, quando
se repete ação, que está em curso"; ou seja, ocorre enquanto em
trâmite duas ações idênticas (quanto às partes, causa de pedir e
pedido - art. 301, § 2º, do CPC).
De pronto, verifica-se pelos próprios argumentos do réu que
litispendência não há, dada a inexistência de identidade da AFABESP
(pessoa jurídica) com a parte autora da presente demanda (pessoa
individual). Afasto a preliminar.
Vale ressaltar, por ser matéria cognoscível de ofício (CPC, art.
301, VII), que também não se verifica a existência de conexão,
(comunhão de objeto ou de causa de pedir - CPC, art. 103), a uma
porque o objeto daquelas ações era reconhecimento de direito
coletivo, enquanto na presente demanda, postula-se o reconhecimento
de direito individual, com pedido declaratório e condenatório
específicos; a duas, porque observa-se, dos documentos juntados pelo
réu, que as ações postuladas pela AFABESP foram extintas sem
julgamento de mérito.
Quanto ao pedido de suspensão do processo, com base no art. 265, IV,
a, do CPC, a extinção das ações coletivas ajuizadas, sem julgamento
de mérito, impede o pedido. Ademais, tocante à (in)existência de
relação de dependência entre as ações coletivas para defesa de
interesses individuais e aquelas a título individual, valiosa lição
extrai-se da obra do mestre Raimundo Simão de Melo :
"tratando-se de interesses individuais homogêneos, a prioridade é
dada em relação aos prejuízos individualmente resultantes do dano
(CDC, art. 99), de maneira que cabe ao trabalhador individualmente
preferir o prosseguimento da sua ação individual, de caráter
indenizatória, ignorando a ação coletiva, principalmente no nosso
sistema em que não há controle da representação adequada, como
ocorre no sistema americano, em que o juiz faz a verificação do
processo e do desenvolvimento da defesa da categoria, para ver se o
autor coletivo agiu com os necessários cuidados [...]. Assim, entre
ações coletivas para defesa de interesses individuais homogêneos, na
busca do reconhecimento da responsabilidade genérica de indenizar, e
as ações individuais para reparação concreta e pessoal dos danos
sofridos pelos trabalhadores vitimados pelo agente agressor, não
ocorre litispendência; quanto à reunião das ações num mesmo processo
ou à suspensão da demanda individual por continência, tal solução
somente será possível se com isso concordar o trabalhador, autor da
ação individual e titular do direito individual tutelado, aplicando-
se inteiramente o art. 104 do CDC".
Ou seja, se a existência de eventual ação coletiva em curso não
impede o conhecimento do direito individual do autor, nos exatos
termos do art. 104 do CDC (Lei nº 8.078-90), não há qualquer motivo
para cogitar-se de suspensão.
Afasto a preliminar e indefiro o pedido de suspensão.
b) carência de ação: ilegitimidade ativa ad causam: aduz o réu que
há ilegitimidade ativa, porque "o autor não é participante de plano
de previdência privado gerido pelo Banesprev", o que acarretaria
sua "ilegitimidade ativa para exigir a aplicação de índice adstrito
a plano gerido por essa entidade" (fl. 108).
Ser ou não o autor titular do direito que fundamenta o pedido é
questão que demanda análise de mérito da afirmação, razão pela qual
não deve o processo ser julgado extinto sem julgamento de mérito,
sob pena de agressão ao direito de ação, que é autônomo e abstrato.
A norma que impõe a "legitimidade de parte" não pode ser
interpretada como óbice ao direito de ação (a lei não excluirá da
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito - CF, art.
5º, inciso XXXV). Nesse ínterim, possui legitimidade ativa quem
alega ser titular de um direito subjetivo cuja satisfação busca
através da tutela jurisdicional.
Afasto a preliminar.
c) carência de ação: ilegitimidade passiva "ad causam": postula o
réu seja reconhecido como parte ilegítima, porque "não é entidade de
previdência privada e, portanto, não é parte que se obrigou ao
reajuste" pleiteado; porque o empregador não se vincula às
obrigações de entidade de previdência; e porque a Banesprev possui
autonomia, sendo impossível a responsabilização de seus
participantes.
A legitimidade da parte passiva é aferida pela sua pertinência
subjetiva em opor-se ao direito alegado em juízo pela parte autora.
No caso, a parte ré é apontada como devedora da pretensão referente
ao bem da vida postulado, razão por que possui legitimidade para
figurar no pólo passivo da demanda.
Ressalte-se que a existência ou não de obrigações ou
responsabilidade da parte ré é questão a ser analisada no mérito
propriamente dito, razão pela qual não deve o processo ser julgado
extinto sem o seu julgamento.
Afasto a preliminar.
d) carência de ação: impossibilidade jurídica do pedido: alega o réu
que, por possuir o autor complementação de aposentadoria oriunda de
Regulamento de Pessoal, não pode pretender reajuste próprio do plano
instituído pela Banesprev. Alega, ainda, que a pretensão do autor é
de aplicação de índice oriundo de negócio jurídico ao qual não anuiu
(plano da Banesprev). Por isso, requer o reconhecimento de que o
pedido é impossível e a extinção do processo sem julgamento de
mérito.
As chamadas "condições da ação" devem ser analisadas de forma
abstrata, pois não se confundem com o mérito da ação. Isso porque a
ação não se condiciona ou se subordina ao direito subjetivo
postulado, mas é direito autônomo e abstrato, constitucionalmente
garantido, de provocar a tutela jurisdicional.
Nessa ótica, somente pode ser considerado pedido juridicamente
impossível aquele que encontra vedação no ordenamento jurídico.
Não é o caso do pedido formulado na presente ação.
Ressalte-se que a procedência ou não do pedido é questão a ser
analisada no mérito propriamente dito, razão pela qual não deve o
processo ser julgado extinto sem o seu julgamento.
Afasto a preliminar.
PREJUDICIAL DE MÉRITO: PRESCRIÇÃO
a) prescrição total: postula o réu o reconhecimento da ocorrência de
prescrição total, pois o autor desligou-se do reclamado em 01-11-
1998.
O pedido trata de diferenças de complementação de aposentadoria, em
parcelas vencidas e vincendas, decorrentes da aplicação do IGP-DI,
de igual forma como é feito aos empregados que optaram pelo Plano de
Complementação de Aposentadorias gerido pelo Banesprev. Alega
ser "inevitável" a aplicação das Súmulas 294 e 326 do TST, além do
disposto no art. 206, § 3º, III, do Código Civil.
Pela própria natureza da parcela, recebida após a aposentaria do
empregado, não há falar em prescrição bienal a contar do término do
contrato de trabalho, mas a partir do alegada lesão ao direito
(critério da actio nata).
De outro norte, a ação não cogita de alteração contratual, razão
porque não se enquadra na hipótese tratada na Súmula 294 do TST.
Também não envolve pedido de complementação de aposentadoria nunca
paga ao empregado, como disposto na Súmula 326.
Por fim, não se trata de pretensão para haver juros, dividendos ou
quaisquer prestações acessórias, mas de critério para reajuste do
valor principal recebido e diferenças decorrentes, razão pela qual
não se aplica o art. 206, § 3º, III, do CC.
Rejeito o pedido de aplicação da prescrição total.
b) prescrição parcial: sucessivamente, pleiteia o réu o
reconhecimento da ocorrência de prescrição parcial, mas atinente ao
biênio anterior ao ajuizamento da ação, e, por fim, a prescrição
qüinqüenal.
O limite de dois anos previsto no art. 7º, XXIX, da CF-88, é para a
propositura da ação; as verbas não alcançadas pela prescrição são
aquelas pretensões imediatamente anteriores a cinco anos, contados
da data do ajuizamento da reclamação. Não há falar, portanto, em
prescrição de parcelas anteriores ao biênio contado da propositura
da ação, mesmo porque no caso presente deve vigorar o critério da
actio nata (cômputo do prazo prescricional a partir da lesão do
direito).
De outro norte, reclama o autor diferenças a contar de 01-09-2001;
assim, por estarem as diferenças compreendidas no qüinqüênio
anterior ao ingresso da ação (09-12-2005), rejeito a prejudicial de
mérito de prescrição.
MÉRITO
O complemento de aposentadoria do autor tem por base o salário dos
empregados (de mesmo cargo, por óbvio) em atividade junto ao réu,
salários estes sem reajuste desde 01-09-2001. Alega o autor,
contudo, que para os empregados da ativa, benefícios são concedidos,
por meio de normas coletivas, para compensar o congelamento
salarial, sem que igual paliativo seja concedido aos inativos.
De outro norte, o réu mantém, através do BANESPREV, plano de
complementação de aposentadoria que concede, aos empregados que o
optaram, reajustes nunca inferiores ao IGP-DI. Requer o autor lhe
seja concedido igual tratamento, com a condenação do réu a reajustar
o seu benefício com os mesmos índices aplicados aos optantes do
plano do Banesprev, e pagamento das parcelas vencidas e vincendas.
Resta evidente que qualquer empregado que busque a complementação de
sua aposentadoria, tem em vista a manutenção do poder aquisitivo
após a aposentação. O sistema público apenas mantém esta paridade
para os aposentados com valores próximos ao salário mínimo; quanto
maior a remuneração da ativa, menor será sua equivalência com os
proventos da aposentadoria, paridade suprimida para as faixas
superiores ao décuplo do mínimo legal.
As condições que regem a complementação de aposentadoria paga pelo
Banesprev (se a atualização dos títulos que formam o "fundo"
garantidor da aposentadoria acarreta o repasse automático dessa
atualização aos benefícios pagos aos optantes do seu Plano) não são
objeto desses autos. Se assim ocorre, deriva de regramento
específico que pauta a relação jurídica existente entre o Banesprev
e os optantes de seu plano.
Entretanto, é evidente que, durante vários e sucessivos anos, o réu
sempre pagou a complementação da aposentadoria com base no salário
dos empregados da ativa, isto até setembro de 2001, quando entrou em
vigor um novo Acordo Coletivo de Trabalho.
Nesse acordo, o reajustamento salarial no período de 1º-09-01 a 31-
08-04 ficou condicionado (parágrafo 1º da cláusula 1ª) a se
verificar uma variação do INPC superior a 9,8%, e somente naquilo
que ultrapassar esse índice.
Como a inflação anual sempre foi inferior a esse índice, os
empregados da ativa e os aposentados (a quem se garantiu a paridade
de vencimentos), não tiveram qualquer reajustamento.
Todavia, uma cláusula que, verdadeiramente, impõe que seja suportada
uma redução salarial de 9,8% ao ano, somente pode ser tida por não
prejudicial, rectius nula, se, analisado o instrumento coletivo,
conglobadamente (princípio do conglobamento), o conjunto de
vantagens não for inferior ao conjunto de desvantagens; ou seja, já
não se examina a lesividade de uma cláusula coletiva isoladamente,
mas em uma interpretação sistemática.
Sucede que o instrumento coletivo trocou o deságio no reajuste
(apenas no que ultrapassar a 9,8%...) por uma série de vantagens
aplicáveis apenas ao pessoal da ativa, tais como: adicionais
(cláusulas 5ª, 7ª e 8ª), qüinqüênio (cláusula 6ª), gratificações
(cláusulas 10ª, 11, 12, 13 e 14), auxílios, complementações e
indenizações (cláusulas 15, 16, 17, 18, 19 e 21), abono
indenizatório (cláusula 35 e 36), aumentos/reajustamentos concedidos
à margem da norma coletiva, de acordo com a função exercida. O TST,
na mesma esteira, no processo TST-DC-149665/2004-6 considerou viável
a não correção em troca das vantagens paralelas concedidas.
Ressalte-se, contudo, que este grande rol de vantagens não é
extensivo aos aposentados que, por evidente, não tem qualquer
interesse, por exemplo, na garantia de emprego. O princípio do
conglobamento deve, assim, impor uma análise não a partir das
cláusulas inseridas no instrumento coletivo, mas sim a partir das
cláusulas aplicáveis aos destinatários, sejam ativos, sejam
inativos. Concessões recíprocas implicam em comutatividade. Não há
comutatividade quando se troca um congelamento remuneratório de
vários anos, por benesses inaplicáveis a determinada parcela dos
beneficiários, que por esta razão, perdem essa qualidade, passando a
prejudicados.
Resta evidente que os trabalhadores da ativa detém um poder de
pressão infinitamente superior ao pessoal aposentado. O réu já não
depende do trabalho dos aposentados que assim, ficam tolhidos do
mais significativo dos instrumentos de pressão, qual seja, a greve.
Egoisticamente, na celebração dos instrumentos coletivos, olvidou-
se, por completo, a situação dos aposentados, sendo quanto a eles
inválida a restrição imposta na cláusula de reajuste, pois foi em
câmbio dessa restrição que foram conferidas vantagens a eles não
estendidas.
Verifica-se, assim, que o réu pretende manter, ao menos até 31-08-
2006, sem qualquer reajuste, as complementações de aposentadoria dos
aposentados, em atitude de clara discriminação. Esta discriminação
fica ainda mais evidente quando se verifica que há dois planos de
complementação de aposentadoria, sendo que um possui mais de 12 mil
empregados e outros menos de meio milhar. Para estes últimos também
o réu forneceu reajuste, por índice próprio (IGP-DI).
Mas ainda não é tudo. Como o autor faz jus à complementação da
aposentadoria e a complementação implica no pagamento apenas na
diferença entre aquilo que paga o INSS e aquilo que o empregado
faria jus a receber, se na ativa estivesse, como o INSS vem
corrigindo os proventos da aposentadoria e a base de cálculo da
complementação vem sendo mantida intacta pelo réu, a cada ano este
terá que desembolsar menos.
Ou seja, conclui-se que não só resta demonstrada a discriminação
entre ativos e inativos, mas também entre inativos e inativos, pois
o sistema de garantias, destinado à observância dos direitos
contratuais dos empregados, quando da privatização do BANESPA, foi
criado em benefício de todos os empregados. O jurista Celso Antonio
Bandeira de Mello, em seu parecer juntado aos autos, esclarece:
"Com o processo de absorção do Banco pelo Governo Federal e ulterior
preparação - a final concretizada - de privatização dele, ficaram
ainda uma vez encarecidos não só os mencionados direitos dos
aposentados e pensionistas aludidos, mas uma particular proteção a
eles com a "securitização' das obrigações correspondentes, que
passaram a ser representadas por ativos escriturados no Sistema
Securitizar da Central de Custódia e de Liqüidação Financeira de
Títulos - CETIP, com as seguintes características (nas quais, aliás,
foi expressamente configurada uma correção salarial atualizadora):
data da emissão: 15 de março de 1.997, atualizáveis mensalmente
sobre o saldo devedor do ativo, a cada dia 15, com base na variação
do IGP-DI, com taxa de juros remuneratórios de 12% ao ano, prazo de
25 anos e pagamento de principal de juros em parcelas mensais e
consecutivas, vencendo a primeira em 15.01.98, sendo de modalidade
nominativa e inegociável.
[...]
Ulteriormente, ao ser promovida a privatização do BANESPA pelo
Governo Federal, que lhe assumira o controle acionário, o Edital de
venda, datado de 03 de outubro de 2000, em sua cláusula 5.2, cuja
rubrica é OBRIGAÇÕES ESPECIAIS DO ADQUIRENTE - NOVO CONTROLADOR,
enuncia que o adquirente das ações e seus eventuais sucessores
ficarão obrigados solidariamente de forma irrevogável e
irretratável, entre outras sujeições a, na conformidade do item VI
da referida cláusula, a "garantir que o BANESPA manterá a sua
condição de patrocinador do Plano de Complementação de Aposentadoria
e Pensões destinado aos funcionários admitidos até 22 de maio de
1975 - Plano Pré-75, aprovado por intermédio do Ofício nº
251/SPC/COJ, de 31 de janeiro de 2.000, junto a entidade fechada de
previdência fechada, sendo-lhe vedada sob qualquer hipótese, a
solicitação de retirada de patrocínio na forma prevista na Resolução
MPAS/SPC nº 6 de 07 de abril de 1988, ou em outras disposições que
disciplinem ou venham a disciplinar a matéria;"
XI - Na cláusula 6.2, relativa a "Constituição e Breve Histórico"
consta uma relação de títulos federais recebidos pelo BANESPA e que
lhe constituem ativos entre os quais estão expressamente
mencionados "Ativos escriturados no sistema "Securitizar" da CETIP,
no valor de R$ 2.902,0 milhões em 15/12/97, corrigíveis pela
variação do índice IGP-DI calculado pela Fundação Getúlio Vargas -
FGV acrescidos de juros de 12% a.a. e amortizáveis em 291 parcelas
mensais, vencíveis a partir de 15/12/98".
[...]
Com efeito, que sentido teriam as mencionadas disposições normativas
e que sentido seria a securitização dos ativos escriturados no
Sistema Securitizar da Central de Custódia e de Liquidação
Financeira de Títulos - CETIP, senão o de tornar determinada
situação jurídica plenamente consolidada, garantida e protegida
contra quaisquer sucessivas alterações? Houve, manifestamente,
nestes atos todos o induvidoso alcance de cristalizar uma dada
situação tornando-a consolidada e defendida de maneira a assegurar
aos seus beneficiários um direito intangível.
Aí se reproduziu modelarmente o que dantes foi visto na precedente
exposição teórica, segundo GABBA, de acordo com o qual é adquirido
todo direito que:
"a) é conseqüência de fato idôneo a produzi-lo, em virtude da lei do
tempo em que foi cumprido, ainda que a ocasião de fazê-lo valer não
se apresente antes da atuação de uma lei nova referente ao mesmo;
b) ao tempo da lei sob cujo império ocorreu o fato do qual se
originou, entrou imediatamente a fazer parte do patrimônio de quem o
adquiriu".
Isto tudo posto e considerado, à indagação da Consulta respondo: "A
correção da complementação da aposentadoria devida aos aposentados e
pensionistas do BANESPA, efetuável pela variação do índice IGP-DI
calculado pela Fundação Getúlio Vargas - FGV acrescida de juros de
12% ao ano, manifestamente se caracteriza como um caso de direito
adquirido, sendo, pois, em razão disto, líquida e certa sua
intangibilidade."
Constata-se, assim, que:
- os sucessivos acordos coletivos de trabalho firmados pelo Banespa,
desde 2001, têm, sob forma de "concessões recíprocas", causado
manifesto prejuízo os aposentados, que não auferem quaisquer dos
benefícios, porque estes circunscrevem-se à realidade contratual do
pessoal em atividade;
- o autor, enquanto beneficiário de complementação de aposentadoria
paga diretamente pelo Banespa, tem direito adquirido à correção da
complementação pelos mesmos índices aplicados aos títulos
securitizados criados para garantir o mesmo benefício (as várias
previsões normativas e contratuais que criaram os títulos e previram
a sua indexação não tiveram outra finalidade que não a garantia dos
direitos individuais, sendo conseqüência lógica a garantia de
manutenção do valor econômico da expressão financeira desses
direitos);
- sendo a correção pelos mesmos índices aplicáveis aos títulos
securitizados, direito adquirido, a conduta do Banco, ao repassar a
correção dos títulos securitizados somente aos inativos que optaram
pelo plano da Banesprev, deixa de refletir mera aplicação
de "planos" diferenciados, para caracterizar verdadeira
discriminação entre optantes e não-optantes do plano da Banesprev,
como se o direito à correção não fosse o mesmo;
- tais condutas discriminatórias do réu (tanto as relativas ao
tratamento entre ativos e inativos, quanto ao tratamento entre os
inativos) infringe os princípios da dignidade, do valor social do
trabalho, da isonomia, da justiça social, da não-discriminação entre
os trabalhadores, dentre outros que constituem direitos e garantias
fundamentais do cidadão (Títulos I e II da CRFB).
Tais motivos conduzem à procedência do pedido, razão pela qual o
acolho, condenando a ré a efetuar os aumentos/reajustamentos anuais
da complementação da aposentadoria, sempre no dia 1º de janeiro de
cada ano, com base na variação do Índice Geral de Preços -
Disponibilidade Interna (IGP-DI), divulgado pela Fundação Getúlio
Vargas, apurado no intervalo de 1º de janeiro a 31 de dezembro do
ano anterior, da mesma forma como se procede com os benefícios dos
inativos que optaram pelo "Plano de Complementação de Aposentadorias
e Pensões do Banespa" do BANESPREV. Considerando que o primeiro
aumento/correção ocorreu em 1º de janeiro de 2001, tendo por base os
12 meses anteriores (1º de janeiro a 31 de dezembro de 2000),
condeno o réu ao pagamento das diferenças vencidas desde 01-09-2001,
mês a mês.
A decisão já determina sejam efetuados os reajustamentos futuros com
base no IGP-DI; não há razão para condenação em diferenças
vincendas, por inexistentes. Eventual falta ou desacordo dos
reajustamentos com o que determinado nesta sentença poderá ser
objeto de execução. Rejeito, assim, o pedido de condenação em
parcelas vincendas.
Litigância de má-fé
Não há demonstração de violação dos deveres de lealdade e boa-fé
processuais por parte do demandante, pelo que não se pode cogitar de
ofensa dos arts. 17 e 18 do CPC.
Ademais, apresenta-se uma grave ameaça ao estado de direito, criar-
se um temor ao exercício do direito de petição. Assim como não há
meios de punir o mero exercício do direito de defesa, quando houve
resistência à pretensão, não se pode, por isonomia, punir-se o
direito de ação, salvo evidente abuso, somente cogitável quando a
pretensão está fadada ao insucesso, sem qualquer possibilidade de
acolhimento.
Rejeito.
Assistência Judiciária Gratuita
Tendo em vista o requerimento formulado na inicial e os termos da
declaração de fl. 14, defiro a assistência judiciária gratuita para
isentar o autor do pagamento de custas e demais despesas
processuais.
Juros e correção monetária
A correção monetária incidirá a partir do mês subseqüente ao de sua
referência (inteligência do art. 459, parágrafo único da CLT) e
juros sobre o capital corrigido (Súmula n. 200 do TST), de 1% ao
mês, na forma do art. 39, § 1º da Lei 8.177-91.
Descontos fiscais e previdenciários
A complementação de aposentadoria é isenta de Imposto de Renda
(Decreto nº 3.000-99, art. 39, § 6º) e de contribuição
previdenciária. Não há desconto a ser determinado.
III D I S P O S I T I V O
ISTO POSTO, nos termos e limites da fundamentação que passa a
integrar este dispositivo, DECIDO, nos autos da AT 9194-2005-001-12-
00-2, afastar as preliminares, rejeitar a prejudicial de prescrição
e a litigância de má-fé argüidas pelo réu, e, no mérito:
a) condenar a ré a efetuar os aumentos/reajustamentos anuais da
complementação da aposentadoria, sempre no dia 1º de janeiro de cada
ano, com base na variação do Índice Geral de Preços -
Disponibilidade Interna (IGP-DI), divulgado pela Fundação Getúlio
Vargas, apurado no intervalo de 1º de janeiro a 31 de dezembro do
ano anterior, da mesma forma como se procede com os benefícios dos
inativos que optaram pelo "Plano de Complementação de Aposentadorias
e Pensões do Banespa" do BANESPREV. Considerando que o primeiro
aumento/correção ocorreu em 1º de janeiro de 2001, tendo por base os
12 meses anteriores (1º de janeiro a 31 de dezembro de 2000),
condeno o réu ao pagamento das diferenças vencidas desde 01-09-2001,
mês a mês;
b) rejeitar o pedido de condenação em parcelas vincendas;
c) deferir o requerimento de assistência judiciária gratuita
formulado pelo autor, isentando-o do pagamento de custas e demais
despesas processuais.
Os valores deverão ser apurados em regular liquidação de sentença.
Juros e correção monetária nos termos da fundamentação.
Custas no valor de R$ 500,00, calculadas sobre o valor da causa, R$
25.000,00, pelo réu (CLT, art. 789, I, e § 1º).
Cumpra-se. Intime-se. Nada mais.
JOSÉ ERNESTO MANZI
Juiz do Trabalho Titular da 1ª Vara do Trabalho de Florianópolis - SC
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