Sangue novo - Carta aberta aos novos advogados da União

ATENÇÃO COLEGAS, VAMOS FAZER CUMPRIR AQUILO QUE ELES (ADVOGADOS DA UNIÃO) SE PROPÕEM A FAZER.....


Tomaram posse nesta segunda-feira (5/9), em todo o Brasil, 370 advogados da União, aprovados em recente concurso público conduzido pelo Conselho Superior da Advocacia-Geral da União.

São vocês jovens de idade média em torno de 25 anos que aceitarão verdadeira missão não apenas de cumprir a Constituição e as leis do país, mas de dar orientação jurídica ao administrador público e de bem defender os bens e interesses da União.

Parece tarefa corriqueira para quem tem formação nas ciências jurídicas, mas a função do advogado da União é de verdadeiro agente político, na medida em que não deve limitar seu trabalho a achar textos legislativos a ampararem as políticas públicas e de governo ou a dar defesa formal em processos judiciais, mas sim, e esse é o desafio, dar-lhes formatação que as conduza para dentro dos limites do direito, enquanto expressão de justiça.

A Administração Pública Federal padece de costumes incompatíveis com a nova ordem constitucional e democrática instauradas pela Constituição de 88. Contenta-se com a aplicação meramente literal de textos legais; impede solução administrativa depois que o cidadão é obrigado a procurar o Poder Judiciário, como se o reconhecimento de direitos dependesse de chancela judicial; cultiva burocracia ineficiente que esconde os direitos embaixo de papéis e despachos inúteis, pois a servidor público não foi capacitado para decidir, entre outras mazelas.

Mas o paradigma mais nefasto que se encontra cristalizado nas repartições e no íntimo dos homens públicos é o de que o valor justiça somente pode ser alcançado nos órgãos do Poder Judiciário.

Há verdadeira subversão da ordem nesse aspecto. O Estado tem o dever de promover e distribuir justiça e deve fazê-lo sem que tenha que provocar conflito com o cidadão. Ao aplicar burocrática e cegamente uma lei provoca, não raro, uma injustiça e, via de conseqüência, um conflito de interesses que vai desaguar no Poder Judiciário com uma solução custosa, não apenas financeira, mas que afeta a própria dignidade do brasileiro que é exposto à demora e a constrangimentos de toda ordem, notadamente os ligados à privação do exercício do direito que tem.

Mas o Estado, quando não tem uma função administrativa juridicamente eficiente, dá azo ao que o ministro Gilmar Mendes, quando advogado-geral da União, chamou de estelionato judicial, ou seja, a ineficiência da Administração dá argumentos a verdadeiras quadrilhas que se valem do processo judicial para fazer valer um direito inexistente. Ademais, insere nos membros da magistratura e da sociedade em geral um sentimento de que a Administração está sempre errada.

A Advocacia-Geral da União é recente e ainda encontra-se em processo de estruturação. A ela está reservada uma missão de vanguarda na dinâmica jurídica. O direito deve ser criado e recriado dentro da Administração, a partir da atuação do advogado de Estado e para que isso ocorra é preciso vidência da cúpula da instituição no sentido de procurar constituir garantias ao exercício da função, tal como a independência técnica na análise de caso concreto, mitigada com instrumentos que permitam a consolidação de uma jurisprudência administrativa.

A perseguição do valor justiça, repito, deve se dar dentro da Administração Federal, mas isso não quer dizer que todas as demandas do cidadão serão acolhidas, pois a justiça não tem lado. Quer dizer apenas que deve ser dado a cada um exatamente aquilo que é seu e negado aquilo que não é. Em ambas as hipóteses, o cidadão deve saber exatamente quais os motivos que concederam ou que negaram o seu direito a ponto de se convencer sem que tenha necessidade de buscar esse convencimento nas raias do Poder Judiciário. Se for, há de ser debitado apenas a insatisfação natural do ser humano.

O compromisso com o cidadão deve ser revelado mesmo dentro de um processo judicial em que o advogado da União, diante das provas produzidas, convença-se do direito vindicado. Nesse caso, a ética do Estado, se é que podemos assim denominar, não permite a perpetuação do conflito e exige imediato reconhecimento do pedido, mesmo antes que o juiz tenha tido oportunidade de se posicionar, pois aqui, mais do que em qualquer outra seara, impera a regra da boa fé objetiva, onde o expoente da colaboração recíproca tendente a descobrir o direito deve ser observado pelo Estado-Administração, que não pode ingressar no jogo de artimanhas e chicanas processuais que lançam nuvens negras a garantirem a prevalência de interesses que, diante da verdade, não se consolidariam.

O advogado da União não deve carregar consigo o ranço da defesa, mas o compromisso com a realização da justiça. Esse vetor tanto permite a solução rápida e pacífica de conflitos instalados, quando se tratar de reconhecimento de direitos, quanto o vigor de uma demanda que vai buscar o direito do Estado, que deve ser entendido com o direito de toda a sociedade, até que se ultime o último apelo.

Se é verdade que esse ideal, que parece tão simples e ao mesmo tempo tão caro ao cidadão, ainda está por ser construído e precisa de agentes qualificados como vocês que hoje assumem seus encargos, também é verdade que essa construção depende de homens e mulheres que não estejam apenas procurando emprego, posição social, status, mas que estejam comprometidas, em primeiro lugar, com os cidadãos miseráveis que dependem da implementação de políticas públicas para viverem com dignidade e com o cidadão contribuinte que quer ver o seu imposto gasto de forma eficiente e justa. Tenho fé!

Com essas palavras é que me dirijo a cada um dos 370 novos membros da Advocacia-Geral da União, na certeza, mais do que na esperança, de que haveremos de construir uma Instituição que seja reconhecida como instrumento primeiro de garantia da cidadania e, ao mesmo tempo, de proteção aos recursos e ao patrimônio da sociedade.



777 - 07/09/2005
Luiz Fernando

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