A cada dia descobre-se que outro banco adotou a prática de trocar a entrega de um talão pronto por folhas avulsas emitidas pela máquinas de auto-atendimento. A medida é alvo de polêmica entre os clientes. Uns reclamam, outros gostam, alguns apenas se conformam. O Banco Central (BC) diz que não há ilegalidade no procedimento, porque a entrega de talão é opcional: o consumidor pode inclusive não querer receber talão. Para especialistas, essa é mais uma forma de os bancos evitarem o uso do cheque e cortarem custos. Já os bancos afirmam que o uso do cheque caiu tanto que essas novas máquinas oferecem a vantagem de o cliente ter a flexibilidade de escolher quantas folhas de cheque quer.
Ana Maria da Graça afirma que ficou espantada quando, em fevereiro, viu pela primeira vez as folhas de cheque saindo da máquina do Bradesco. Ela reclamou e o atendente disse que procurasse a área de Serviços do banco, onde poderia receber a capa.
— Não sabia da mudança e não gostei. As folhas ficam soltas e não têm capa. Gosto da capa, que tem o telefone do setor de atendimento do banco e calendário. E como pego sempre talão com 20 folhas, não consigo grampeá-lo com o pequeno grampeador que tenho em casa. Tive de enfrentar uma fila na parte de Serviços para fazer o talão. Ou seja, o tempo que economizei na máquina, gastei na fila. E gostaria de saber se vou pagar menos pelas folhas, já que o banco está economizando no grampo e na capa — reclama Ana Maria.
Máquina recolhe folha que não é retirada
Solange Ramos também não aprovou a novidade. Ela conta que, como não sabia da troca, não prestou atenção:
— Não puxei logo as folhas e só consegui pegar quatro cheques. A máquina recolheu e cancelou os outros 16. Fui reclamar e me mandaram procurar outra máquina.
O Bradesco, que implantou os novos equipamentos em janeiro, explica que tem dois tipos de máquinas: uma emite folhas soltas e outra, o talão pronto. E acrescenta que o consumidor pode escolher entre receber o talão na agência ou em casa. O banco esclarece ainda que a cobrança é feita por cheque compensado: se o talão for retirado na agência, o valor por cheque compensado é de R$ 0,65; se o talão for entregue em domicílio, é de R$ 0,48; retirada na máquina, cada folha solta compensada custa R$ 0,40; e se a máquina emitir o talão pronto, cada cheque fica por R$ 0,63 no talão de dez folhas e R$ 0,40 no de 20 folhas.
Luiz Carlos Dias dos Santos, cliente do Banco do Brasil, diz que também não gosta do novo sistema, pois não consegue se organizar:
— As folhas ficam soltas e nunca sei quantas faltam para acabar. Além disso, como não está tudo grampeado, acabo perdendo o canhoto. Outro dia entrou um débito na minha conta e não conseguia me lembrar quem era o destinatário do cheque, pois tinha perdido o canhoto. Além disso, corro o risco de perder uma folha e nem me dar conta, o que facilitaria um uso indevido.
Luiz Lima, também cliente do Banco do Brasil, já pensa diferente. Ele disse preferir pegar poucas folhas:
— Acho mais confortável não ter que andar com um talão grande, e mais seguro também. Se eu for roubado, serão menos cheques a serem suspensos. Na verdade, a cada dia uso menos o cheque e mais o cartão de débito.
Édson Monteiro, vice-presidente de Varejo do Banco do Brasil, afirma que este procedimento não é novidade, pois o banco o adotou em 1998. Ele explica que o cliente tem o direito de pegar o talão pronto na agência. Os clientes exclusivos — uma classificação de relacionamento utilizada pelo banco — podem receber o talão em casa, pagando R$ 6 pela entrega:
— O cliente quer conveniência. Adotamos esta solução porque hoje 90% das transações são feitas por meios eletrônicos. A maioria dos clientes utiliza a quantidade de cheque prevista na cesta de tarifas, mas se ele precisar de cheques extras pagará R$ 0,33 por cada um.
No Itaú, a aposentada Maria das Dores Silva diz que não gosta das folhas soltas:
— Já estou com a memória fraca e fico sem saber onde guardei as folhas. Mas agora aprendi a usar o cartão e estou tentando usar menos cheques, porque estava pagando uma taxa extra por cheque de pequeno valor.
Procon: consumidor tem de ter opção
O Banco Itaú esclarece que os talões são retirados nas agências, entregues na residência dos clientes ou emitidos pela máquina no auto-atendimento. A tarifa de entrega em domicílio está incluída no pacote da Maxiconta Total e, no caso de talões extras, é cobrada a taxa de R$ 4,50 por entrega. No auto-atendimento o talão de sete folhas custa R$ 3. O Itaú explica ainda que mantém um sistema inteligente que monitora o consumo de cheques para adequar o fornecimento ao perfil do correntista.
Paulo Arthur Góes, assistente de direção do Procon de São Paulo, observa que o banco pode implementar meios alternativos de atendimento ao consumidor, mas não pode restringir os meios convencionais:
— O consumidor tem que ter opção, não pode ser obrigado a utilizar apenas o meio eletrônico. É preciso pensar na diversidade das pessoas. Os idosos têm mais dificuldade de lidar com as máquinas, por exemplo.
Antonio Mallet, coordenador jurídico da Associação de Proteção e Assistência aos Direitos da Cidadania (Apadic), diz que nesse caso não há quebra de contrato, pois os bancos estão instituindo mais uma forma:
— Na verdade o que os bancos querem é diminuir custos, e essa é mais uma forma de pressionar o cliente a usar menos cheque. Eles economizam na capa, porque nem todos pegam, e, principalmente, na compensação.
Fonte: Jornal O Globo
| |