Dispensa de testemunha caracteriza cerceamento de defesa


A Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (SDI-1) manteve o entendimento da Primeira Turma do TST que julgou caracterizado o cerceamento de defesa diante da dispensa de testemunhas por parte do juiz de primeiro grau num processo movido contra o Unibanco.

Desde a inicial da reclamação trabalhista, na qual pedia, entre outros itens, o pagamento de horas extras, uma ex-funcionária do Unibanco afirmou que assinava nas folhas de ponto “alternadamente, e em épocas variadas, ora os horários corretos, ora o que lhe era exigido pelo banco através do gerente administrativo”. Por isso, pediu que fossem ouvidas testemunhas a fim de comprovar que fazia horas extras.

As testemunhas foram convocadas mas, na audiência, seu depoimento foi indeferido. O juiz de primeiro grau justificou o indeferimento dizendo ser evidente, no estudo da prova, “a indivisibilidade da prova documental, já que um documento não pode ser tido como idôneo para confirmar um fato favorável e imprestável para demonstrar aquilo que seria contrário ao interesse da parte” – ou seja, não seria possível considerar que os registros de ponto fossem válidos em alguns dias e inválidos em outros. A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho, reforçando o argumento de ser incabível a bipartição de provas.

No julgamento do recurso de revista da ex-bancária contra a decisão do TRT, a Primeira Turma do TST entendeu que houve cerceamento de defesa, porque o fato de o banco apresentar os cartões de ponto, mesmo tendo sido a pedido da outra parte, não afastava o direito da trabalhadora de provar, como vinha sustentando desde o início, “que tais documentos não espelhavam a realidade dos fatos.” Segundo a decisão da Turma, “a indivisibilidade de um documento tem total procedência, mas cartões de ponto não equivalem a um só documento. São vários, que se prestam a consignar, diariamente, a jornada cumprida”.

Insatisfeito com a remessa do processo de volta à Vara de origem, o Unibanco ajuizou embargos em recurso de revista à SDI-1, insistindo na tese da bipartição da prova e alegando que a própria ex-funcionária, “sem impugnar expressamente os referidos documentos, reconhece que estes denotam sua real jornada em alguns dias trabalhados e em outras não”. O banco baseou sua defesa no art. 400 do Código de Processo Civil, que faculta ao juiz indeferir prova testemunhal quando o tema em questão já tiver sido provado por documento (no caso, os cartões de ponto), e na CLT (art. 765), que garante aos juízes ampla liberdade na direção do processo, podendo, portanto, dispensar testemunhas.

O relator dos embargos, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, afirmou em seu voto que a liberdade do juiz na condução do processo prevista pela CLT “não pode estar dissociada dos princípios relacionados ao contraditório, conforme determina a Constituição Federal” (art. 5º, LV). Com relação ao art. 400 do CPC, ressaltou que “os meios de prova no processo do trabalho têm singularidade, visto que o empregado, muitas vezes, é compelido a anotar não a realidade da jornada de trabalho, mas sim aquela que é determinada por seu empregador”. No caso dos cartões de ponto, “a produção da prova documental é pré-processual, ou seja, é realizada durante a vigência do contrato de trabalho. O exame de documentos deve ser analisado em conjunto com os demais meios de prova.”

Ressaltando que a reclamação trabalhista tinha por objeto justamente “demonstrar que a jornada de trabalho não era a constante dos cartões de ponto, não se trata de bipartição de prova, uma vez que o registro é diário, e, em confronto com a prova testemunhal, incumbe ao julgador cotejar os meios de provas trazidos, a fim de formar a convicção em relação à real jornada de trabalho.”

Com esses fundamentos, a SDI-1 reafirmou o cerceamento do direito de defesa e determinou a volta do processo à Vara do Trabalho onde se deu a inicial, para que as testemunhas possam ser ouvidas.

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho




515 - 30/04/2005
Álvaro Pozzetti

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